É sempre complexo julgar trabalhos em processos e exercícios cênicos. Pois supõe-se que o trabalho exposto ao público está acabado e sabemos que no universo das artes cênicas isso é um mito em muitas das vezes. Digo isso pois é comum que o trabalho dos atores, a cena em si, amadureça com a repetição e ganhe definições mais interessantes. Afinal, é a repetição a mola propulsora do artista – a repetição e a ausência de medo de se investigar. Em “RECORDAR…”, Sol Faganello conduz os aprendizes da turma de atuação do Módulo Vermelho da SP – Escola de Teatro e optou por trabalhar fragmentos de textos, que aparentemente não se conectam e acaba parecendo uma grande colcha de retalho, o que desfavorece o todo, pois o público percebe logo o jogo cênico proposto e esmorece na cadeira.
Em cena há fragmentos de textos como os clássicos “Medeia” e “A alma boa de Setsuan” junto com textos contemporâneos como “Tom na Fazenda”, “Por Elise” e “Cérebro Coração”, que são de conhecimento de “gente de área”, digamos assim. Respectivamente escritas por Eurípides, Bertolt Brecht, Michel Marc Bouchard e as atrizes Grace Passô e Mariana Lima. Para citar alguns exemplos. A forma como Sol amarra e “desamarra” as cenas é didática e escolar, digamos assim. Um público mais atento observa que mesmo no coletivo alguns alunos simplesmente se apagam. Seja pela falta de coordenação, de tonos, de presença cênica mesmo, não é fácil, convenhamos.
O que chama atenção – positivamente – no exercício é a forma como a direção, com assistência de Luciana Schwinden, trabalhou com eficiência o texto na boca dos alunos – o que é um diferencial de outros resultados da própria instituição, diga-se de passagem. Vale destacar Esther Queiroz que abre o exercício (e depois some da apresentação) com muita propriedade. E estabelece um nível alto para que os colegas de cena se apropriem do seus textos. Não é tarefa fácil. Outra “entrega” que chamou a atenção foi a de Danilo Narciso para o hermético texto de Mariana Lima. Numa possível ausência de compreensão de sentido, explorar a palavra na boca e no corpo é uma opção potente para se buscar um caminho.
Jasão e Joana, não são personagens de fácil assimilação, nem Chen Tê, nem Tom e Francis – nesse último caso, por se tratar de uma obra (Tom na Fazenda) com o qual esse que vos escreve tem muita familiaridade, não deixou de ser curioso o recorte escolhido. Já que se trata de personagens cheios de contradições, que foram resumidos em poucas ações: o desejo e a morte.
Talvez “RECORDAR…” seja sobre isso, a coragem de se jogar e voar em cena. Mesmo que nem todos consigam alçar voo nesse momento – pois todos tem seu tempo – supõe-se que o trajeto foi ensinado.