A recepção do espetáculo provoca uma reflexão logo na fila de entrada, quando o público é convidado a responder à pergunta: “Hoje, na energia que você está, acredita que é possível realizar seus sonhos?” A contagem dos “sim” e “não” dá o tom do que está por vir, criando uma conexão imediata entre a plateia e a temática central do espetáculo.
Na caixa preta, um círculo de cadeiras rodeia corpos adormecidos espalhados pelo chão, com uma pilha de papéis amassados no centro. Gradualmente, o elenco começa a tentar acordar, levantar e iniciar o dia — uma cena simples, mas carregada de simbolismo. Esse recurso é explorado de forma eficaz, criando uma transição entre o sono e o despertar, tanto físico quanto emocional. Em determinado momento, uma das atrizes interrompe a ação e começa a contar sobre um sonho lúcido envolvendo um cabo de guerra. A partir daí, o espetáculo se desvia para uma pesquisa sensível, marcada pela diversidade de corpos em cena e pela forma como o jogo de palavras se desenvolve, funcionando simultaneamente nos níveis sonoro e visual. É uma experiência deslumbrante.
O trabalho me impactou de maneira inesperada quando os atores começaram a abrir os papéis e ler sonhos para alguém aleatório da plateia. O relato que chegou até mim falava sobre o “sonho químico” — uma pessoa que não sonha devido ao uso de medicação para dormir. Curiosamente, essa é a realidade da voz que escreve esta crítica. Uma daquelas coincidências intrigantes do teatro. Ou as questões do onírico são apenas mais comuns e recorrentes do que eu imaginava?